segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Entrevista com MF Wagner Guimarães (1 parte), por Rafael Rafic

Posted on 19:18 by Mourão, Elcio Conte Lofredo

Após a entrevistar o filho, o pai. Finalmente chegou a hora deste blog entrevistar o extrovertido, e por vezes polêmico, MF Wagner Peixoto Guimarães, grande expoente do nosso clube. Para quem acha que essas entrevistas estão ficando por demais caseiras, já adianto que estamos tentando uma entrevista em dezembro com um ótimo MI de fora do clube.

Rafael Rafic: Para começar o que já está virando tradição: nome completo, data e local de nascimento:
Wagner Peixoto: Wagner Peixoto Guimarães, nasci no dia 26/05/1971 no Rio de Janeiro.

RR: Você não vem de família com tradição enxadrística, como o xadrez cruzou sua vida?
WP: Eu tinha primos e um tio que sabia mover as peças e na verdade a beleza das peças me cativou, devia ter uns 12 anos. Aprendi com um desses primos, na verdade meio errado já que ele não fazia movimentos especiais como roque e etc.

RR: Como se deu o salto de um primo que nem roque sabia para um devorador de livros de xadrez?
WP: Eu ganhei de um tio um livro chamado “Xadrez Básico” do Orfeu D’Agostini, muito conhecido no meio enxadrístico, e um jogo de peças de madeira que tenho até hoje. Também tinha um amigo que jogava vários jogos comigo e, depois de jogarmos com outros amigos o WAR, ele vendo o meu xadrez no quarto me perguntou se eu sabia jogar. Eu falei que sim, mas na verdade eu só sabia o que meu primo me explicou. Joguei e perdi em 4 lances com o famoso mate ao pastor. Achei o meu amigo um gênio de xadrez por isso, como perder em um minuto? Com isso finalmente abri o livro e achei na pagina 22 esse mate que ele me deu se não me falha a memória. Ali começou a dedicação e depois de dois meses eu já ganhava dele.
Passado algum tempo apareceu na televisão um torneio de xadrez chamado cuca legal no ano de 1985, patrocinado pela Rede Globo. Esse torneio era uma febre, com mais de 600 crianças do estado inteiro só na 1 fase. Foi no Colégio Pedro II em São Cristóvão e me lembro que fui eu, esse amigo e o professor desse amigo. Infelizmente não fui para a 2ª fase, pois eram necessários 5 pontos em 8 e eu fiz 4. Mas fiquei contente com meu resultado, já que esperava perder todas.
Eram 2 cuca legais por ano: esse foi o de inverno, depois teve o de verão em outubro.Tinha uma amiga da minha mãe a qual viria a ser minha professora de historia depois no 2 grau que tinha um filho federado, Daniel Arendt, infelizmente já falecido. Ele me emprestou alguns livros e meu nível deu um salto absurdo. No Cuca Legal de verão fiz 5 em 5 e nem precisei jogar as outras rodadas, me classificando para a 2ª fase com os federados. Nela fiz 4,5 em 8 e fui o 2° colocado entre os não federados até 14 anos e isso foi uma grande motivação. Eu me lembro que na 1 rodada joguei com um federado que perguntou o meu rating e eu retruquei “O que é rating?”. Ele me olhou com uma cara de nojo e falou que o dele era 1289, o que me deixou morrendo de medo. Como o cara era capivara, eu ganhei dele.
Depois desse torneio recebi uma carta da Rede Globo para jogar um torneio Schuring (todos contra todos) com 16 jogadores em que os 5 melhores se federavam. Eram 15 cansativas rodadas em apenas 2 dias. Fui o 4° colocado nesse torneio e então me federei pela Associação Atlética Rede Globo.
Então recebi em casa uma carta para jogar o Interclubes de 1985, que sequer sabia o que era na época. O clube tinha 2 equipes C fortíssimas mas só tinhas um jogador B, então, como o regulamento permitia na época, fui completar a equipe B. Ainda era na época da suspensão então foram 9 rodadas em 4 finais de semana, mas eles me davam pelo menos o dinheiro para a passagem e lanche. Era divertido.

RR: Em algum momento você chegou a ter um professor de xadrez?
WP: Não, fui autodidata. Depois que dei um salto fantástico, o Silvio Resende falou que foi meu professor, mais na verdade ele me orientava como estudar com a didática dele e me deu muitos livros também na época, mas não chegou a me dar aulas. Eu tinha dificuldades financeiras enormes para jogar xadrez.

RR: Era isso que ia perguntar. Como você conseguia o dinheiro suficiente para jogar?
WP: Às vezes meus pais tinham e como eu ia até mal vestido para as competições sempre alguém me dava sem eu pedir. Pode parecer falsa modéstia, mas se eu tivesse um apoio massificado na época eu seria no mínimo um MI. Tinha um talento absurdo, não falo por soberba

RR: Mas quando você percebeu que daria ganhar a vida com isso?
WP: Na verdade eu só queria ganhar como qualquer adolescente e tomei uma decisão de melhorar meu nível jogando contra os melhores. Eu já tinha um rating de 1448 que me colocava com chances de ganhar o sub 14, mas preferi jogar o Carioca sub-20 pois era mais forte. Antigamente o carioca classificava para o estadual.

RR: Mas em algum momento, você tomou a decisão de fazer do xadrez sua profissão. Quando foi isso? Ou foi algo que se concretizou aos poucos?
WP: Foi com os títulos e eu precisava ganhar dinheiro. Comecei a dar aulas timidamente e depois fiz um curso de professor no congresso da FIDE em 1993. Formei, graças a deus, vários campeões: Daniel Rangel ganhou 5 estaduais, Israel 3. Tenho bastante títulos com alunos também.

RR: Voltando atentamente ao Interclubes. Após 23 anos como federado você já jogou 20 Interclubes. Você lembra por onde jogou todo os 20?
WP: AARG 1985 e 1986, Clube Municipal de 1987 a 1991, ALEX 1992, AXAMA 1993, CNAV 1994 a 1997, CXGR 1998 a 2000, 2001, IBC em 2002, NXN em 2003 e 2004, IBC de novo em 2005, 2006 CXGR e 2007 Clube de Xadrez Mendes. Foram 3 títulos por equipes com o Grande Roque, 1 com a AXAMA, 1 com o IBX e 1 com CMUN.

RR: Classe A desde quando?
WP: 1989

RR: Com toda essa experiência, você deve ter opiniões sobre as questões mais polêmicas do atual formato do Interclubes. Então vamos a elas. Você é a favor de 2h de pensamento e 3 dias ou 1h de pensamento e 2 dias?
WP: O melhor é sempre 2 horas, é mais técnico. Mas sei das dificuldades dos clubes do interior, então temos que fazer uma ponderação.

RR: Mas você acha que essa diferença de tempo de reflexão causa muita diferença nas classes B e C?
WP: É preciso exercitar o tempo desde as categorias de baixo, o problema é a adaptação. Por exemplo, uma pessoa que sempre jogou os escolares com 20 min para cada jogador não vai saber administrar o tempo nos primeiros jogos de 1 hora, mas é preciso disciplinar que o xadrez é um esporte intelectual e difícil. Tem que ter tempo para pensar, essa é minha opinião.

RR: Você é a favor da pontuação da Classe A ser 50% maior do que o resto para a pontuação geral?
WP: Sim, o nível técnico é maior.

RR: Por fim, você é a favor da contratação de jogadores de fora do Rio para jogar o Interclubes?
WP: Sim, acho que melhora o nível técnico. Vejam a liga espanhola com Ivanchuk jogando, por exemplo. O Interclubes é um torneio diferenciado em todos os aspectos, por isso você tem de se despir de vaidades muitas vezes. Eu tenho orgulho de fazer parte de algo em 1991 que, ao meu ver, nunca mais será repetido quando o CMUN ganhou as 3 categorias no mesmo ano. Ainda teve a C2 fazendo dobradinha e B2 em 3° lugar.
Eu treinava muito pesado essa equipe, o Silvio Rezende pode comprovar. Mendes teve sucesso porque a maioria dos jogadores queria ser uma família.

RR: Mas como ser família com jogadores contratados que não conhecem seus companheiros?
WP: O querer é independente disso. Quando se convoca uma seleção de xadrez para ir a uma Olimpíada, muitos não se conhecem tão bem, mas todos querem a medalha. O importante é o objetivo comum.

RR: Já que você tocou em Mendes. Qual a importância para uma cidade do interior um título como o do Interclubes 2007?
WP: Enorme. Atrai a prefeitura, patrocinadores e o fato é que Mendes nem tem 5 anos de existência. O Elcio faz um trabalho irrepreensível e não falo para “puxar saco” porque não sou assim. Muitas vezes discordamos, mas a competência dele é indiscutível. Na verdade qualquer capitão de equipe tem de ser chato para dar certo. Eu sou exigente em vários aspectos e ainda tem gente que acha que não entendo de Interclubes.

RR: Alias, você e Elcio trabalham juntos e tem muitos objetivos comuns, mas existem muito atritos, inclusive eu mesmo presenciei um forte há dias atrás. Como vocês lidam com eles, afinal de contas no final vocês sempre se ajeitam?
WP: Vou dar um exemplo. O São Paulo é o líder de futebol e deve ganhar o brasileiro, infelizmente. Teve muita briga interna para demitir o técnico e o presidente manteve pé firme. Montar essa equipe foi o desafio mais difícil que tive, com muitos jogadores no mesmo nível. Fiquei dois dias calculando a melhor formação e espero ter acertado. Sempre vou pensar no melhor do clube, dessa vez não foi diferente.

RR: Você recebeu propostas muito boa para sair de Mendes esse ano, inclusive financeiramente, o que te manteve no Clube de Mendes?
WP: Acho que a palavra de honra que tive com o Elcio. Eu joguei por Franca os regionais de São Paulo e falei que jogaria o interclubes por Mendes. Além disso, tem o carinho que todos tem pelo meu filho.

11 Response to "Entrevista com MF Wagner Guimarães (1 parte), por Rafael Rafic"

.
gravatar
MI-AF Eduardo Arruda Says....

Vocês estão de parabéns!!!!
Muito boa a entrevista com o Wagner.
Realmente me surpreendeu.
Agora o Elcio posta tudo em primeira mão menos a escalação das equipes de Mendes.
MF Eduardo Arruda

.
gravatar
Maiakowsky, um blog sobre xadrez (e algo mais!) Says....

Parabéns ao blog pela entrevista com o Wágner. Concordo com ele: se tivesse um apoio maior (ou tivesse nascido em Cuba!) teria sido MI!
Mas para mim, em virtude da sua dedicação e enfrentamento das adversidades , é um GM!
Viva Wágner e viva esse fantástico e amado jogo que é o xadrez!!

.
gravatar
Rafael Rafic Says....

A entrevista foi bem longa, foram 3 horas e meia de ótimo papo com o Wagner.
Essa foi só a 1ª parte onde foquei mais o início e o Interclubes, ainda virá daqui a alguns dias uma 2ª parte falando sobre finais de Brasileiro, Olimpíada sub-26 e a vida como treinador.

.
gravatar
Anônimo Says....

o wagner é um talento absurdo, lembro-me claramente ele com aproximadamente 15 anos enxergando lances que nem poderia supor que poderiam aparecer no tabuleiro, parabens a esse exemplo de jogador, professor e pai. francisco

.
gravatar
Marcelo Says....

A entrevista é excelente. Bem,tenho o privilégio de ter acompanhado o início das 2 gerações da familia Peixoto Guimarães. Wagner é um dos maiores recordistas da FEXERJ, 3 em numero de partidas e talvez o que mais tenha ganho torneios diversificados, praticamente todos (Claro que não deu pra jogar o feminino rsrs) e isto já é o suficiente. Sua trajetória adversa é um exemplo pra vários. E ser MI é consequencia (ele já venceu diversos)...

.
gravatar
MI-AF Eduardo Arruda Says....

Marcelo, você falou :

"talvez o que mais tenha ganho torneios diversificados, praticamente todos..."

Você cometeu um pequeno equivoco,não é "talvez", o Wagner é realmente o maior detentor de títulos da FEXERJ, mesmo sem ter conseguido ganhar nenhum feminino.
E alem de excelente enxadrista é um grande técnico .

MF Eduardo Arruda

.
gravatar
Anônimo Says....

não sou de rasgar ceda, mais agradeço todos os elogios que recebi do mestre fide eduardo arruda e de todos os meus admiradores, não precisa nem falar a diferença que ele esta fazendo na direção do PXSC, torneios de otimo nivel tecnico com jogadores do quilate dos MIS teixeira e limp, marcelo é uma pena que eu não possa jogar o feminino, mais quero quebrar mais recordes

.
gravatar
Marco Coutinho Says....

Sempre admirei a técnica que o Wagner utiliza em suas partidas e, principalmente, sua análise, onde vimos os planos de que ele dispunha. Realmente, com apoio financeiro, nem sabemos onde ele poderia ter chegado. Mas, se assim tivesse acontecido, não teríamos este enorme privilégio de desfrutar desta agradável companhia. Parabéns por tudo que você já fez e certamente irá fazer, Wagner, e parabéns ao Rafael Rafic pela excelente entrevista.

.
gravatar
Paulo Rodrigues Says....

Parabéns ao Rafael por mais uma boa entrevista. o MF Wagner é uma pessoa excepcional e de um nivel enxadristico elevadissimo, sinto-me honrado em poder fazer parte do seu circulo de amizades e alunos embora não esteja tendo aulas com ele no moemento devido a problemas pessoais.

Um abraço Wagner e sorte a toda equipe do CXM no Interclubes.

.
gravatar
Márcio Says....

Wagner está errado mi só o Limp. Teixeira só tem uma norma que foi a do torneio da Alex. As duas primeiras não valerão. Perguntem ao Darcy Lima que esteve na Alemanha no congresso da fide.

Visitas

Clima/Tempo de Mendes.

Festival Folia MóVidão & CXM

Festival Folia MóVidão & CXM
Programação do Festival: Dia 05/03: Chegada dos Atletas, depois bloco do MóVidão

Jogos Escolares Cenecistas (JECs) de Xadrez

Jogos Escolares Cenecistas (JECs) de Xadrez
Classificando os seus representantes do Polo 2, na Estadual. O evento foi realizado no CNEC de Paracambi, com coordenação e arbitragem pelo Professor AF Elcio Mourão

I Magistral Octavio Trompowsky

I Magistral Octavio Trompowsky
Valendo rating CBX e FIDE, nos dias 23 a 25 de abril. Premiação de R$ 1.000,00 !!! Com 40 participantes, o vencedor foi o MI Diego Berardino.

Festival Folia MóVidão & CXM

Festival Folia MóVidão & CXM
Programação do Festival:- Dia 13/02: Chegada dos Atletas, Dia 14/02 Torneio de Xadrez e saída para o bloco do MóVidão

Arquivo do Blog